quinta-feira, 20 de março de 2014

O COMPORTAMENTO DO SER HUMANO NÃO É PREVISÍVEL - EXTRAÍDO DO LIVRO "OS AXIOMAS DE ZURIQUE"





"O comportamento do ser humano não é previsível.  
Desconfio de quem afirmar que conhece uma nesga que seja do futuro."





Em 1969, quando o Índice de Preços ao Consumidor subiu cerca de 5%, o consenso entre importantes economistas era de que no começo dos anos 70 a inflação subiria um pouquinho, mas cederia no final da década.  Não cedeu. Dobrou.

Em 1979, quando o índice deu um salto arrasador de 11,5%, era unanimidade entre os sábios que a taxa ficaria nos dois dígitos até meados da década de 80. Não ficou. Em 1982, estava de volta nos pacíficos níveis de 1969.

É de se pensar: para que ficar dando ouvidos a esses profetas da economia, que sabem tanto do futuro quanto você e eu?  Ouvimos, não tenham dúvida, porque hoje, como desde sempre, o conhecimento do futuro é um dos mais desesperadamente ambicionados objetos do homem. Se você conseguisse ler hoje cotações da Bolsa de amanhã, seria um homem rico. É por isto que, cada vez que alguém se levanta e anuncia uma visão do futuro, ouvimos com todo respeito.

Com grande freqüência, é erro ouvir. Em 1929, no dia 23 de agosto, o Wall Street Journal dizia aos seus leitores que poderiam ganhar muito dinheiro na Bolsa. A bola de cristal do WSJ, uma técnica de enxergar o futuro chamada Teoria Dow, revelava que, no mercado de ações, estabelecera-se ‘’uma forte tendência de alta’’.

E afirmava: ‘’Para os meses vindouros, as perspectivas são mais brilhantes que nunca.’’ O jornal prosseguiu contando vantagens, feliz. Dois meses depois, entrou todo mundo pelo cano.

Mais recentemente, no começo de 1981, Joseph Granville, um guru da Bolsa, anunciou que o mercado estava para despencar. ‘’Vendam tudo!’’, dizia ele aos seus milhares de discípulos, assinantes do seu serviço especial de informações. O colapso anunciado não ocorreu. O mercado passou o ano de 1981 numa gangorra, Granville continuava profetizando o desastre. O ano seguinte, 1982, testemunhou o início de uma alta espetacular, uma das maiores e mais repentinas da história. No mercado que começou aí, quem ficou para trás nunca mais deixou de se lamentar.

Não foi só Granville que não previu a alta, ou previu o contrário. O ano de 1983 foi especialmente miserável para os oráculos financeiros. Examinem-se os resultados dos administradores financeiros - os profissionais que operam ‘’investimentos’’ (ou, como preferimos nós, especulações) de companhias de seguros, fundos de pensão e outros que tais. Segundo estimativa do New York Times, em 1983 três quintos desses videntes regiamente pagos deram tantos palpites errados sobre o futuro, que tiveram lucros menores do que teria um especulador novato que escolhesse ações jogando dados.

A medida mais usada para avaliar o desempenho de um investimento é o índice Standard & Poor, composto por 500 ações ao portador. Em 1983, esse índice subiu 22%. Por outras palavras, se nesse ano a sua carteira de especulações apresentou um ganho de 22%, você operou na média. A sua nota seria regular. 




Segundo a pesquisa do New York Times, 60% dos administradores profissionais de dinheiro ficaram abaixo disso.  Houve um administrador, que já foi famoso, que previu uma queda nas taxas de juros para 1983, de forma que investiu pesadamente em papéis de renda fixa. Os juros subiram e, em conseqüência, despencou o valor dos seus títulos. O mesmo indivíduo achou que as ações de laboratórios farmacêuticos subiriam, e elas caíram; na opinião dele, as mudanças projetadas para a indústria telefônica seriam particularmente benéficas para a MCI, e ele entupiu as carteiras de especulação dos seus clientes com papéis dessa empresa. Que se revelou um fracasso.

A verdade é que ninguém tem a mais remota idéia do que vai acontecer ano que vem, semana que vem, nem sequer amanhã. Se você está a fim de chegar a ser alguém como especulador, a primeira coisa a fazer é largar o vício de dar atenção a previsões. É da maior importância jamais levar a sério economistas, especialistas em mercado nem quaisquer outros oráculos financeiros.

Às vezes eles estão certos, é lógico, e é isto que os torna tão perigosos. Depois de passar alguns anos bancando o profeta, qualquer um deles é capaz de, orgulhosamente, exibir meia dúzia de palpites que deram certo. ‘’Fantástico!’’, todo mundo exclama. O que nunca aparece na publicidade do profeta é a lista de todas as vezes que ele errou.

‘’É fácil ser profeta’’, disse, certa vez, o conhecido economista Dr. Theodore Levitt, na Business Week.  ‘’Você faz 25 previsões, e depois só comenta as que deram certo.’’ Nem todos os magos são assim tão francos, mas, na intimidade, todos concordariam com a fórmula do sucesso do Dr. Levitt. Economistas, especialistas em mercado, oráculos políticos, videntes, todos sabem de cor a regra básica: se não consegue prever certo, preveja muito.

Dá para observar os economistas que todo ano obedecem a essa regra. Nos Estados Unidos, por volta de junho ou julho, os mais conhecidos profetas começam a emitir seus solenes palpites sobre o primeiro trimestre do ano vindouro. Esses palpites, geralmente, referem-se aos grandes indicadores: PNB, taxa de inflação, juros etc. Uma vez que, obviamente, estudam cuidadosamente as previsões uns dos outros, a tendência é que freqüentemente ocorra uma extraordinária uniformidade no que ele prevêem. Muitos especuladores baseiam suas decisões nesses palpites; empresas poderosas e o governo fazem o mesmo.

Por volta de setembro, todos os anos, o panorama econômico se apresenta levemente diferente, e os economistas aparecem com ‘’revisões’’ para suas previsões sobre o primeiro trimestre vindouro.  Em novembro, as coisas tornaram a mudar, de forma que lemos revisões das revisões. Em dezembro... Bom, você já viu como a coisa funciona. Cada um dos oráculos reza para que ao menos uma das suas previsões seja acertada. O mais provável é que as certas estejam entre as mais recentes, já que foram feitas mais perto do período prognosticado; às vezes, porém, uma das previsões mais antigas dá na mosca. O profeta tirará grande partido do fato:  - Previ isso em julho!

Ele terá todo cuidado em evitar dizer que a sua previsão correta foi cancelada e superada por previsões e revisões das revisões, posteriormente divulgadas.  Quanto a mim e você, solitários especuladores tratando de fazer algum, o nosso negócio é cair fora de toda essa lengalenga. Se as previsões de junho serão revistas em setembro, e estas reavaliadas em novembro, e depois em dezembro, vou ficar escutando o quê? Aceitar como válidas profecias feito essas é como comprar uma entrada cuja validade está programada para expirar antes que o espetáculo seja encenado.




Nem todos os oráculos têm sido capazes de organizar essa dança anual de revisões de previsões econômicas, mas são todos seguidores da regra básica. Todos produzem previsões freqüentes, e vivem na esperança de que ninguém as examine com muito cuidado.

Sempre foi assim. Um obscuro médico francês, Michel de Notre-Dame, que viveu no século XVI, fez centenas de profecias. É conhecido até hoje pelo seu nome na forma latina, Nostradamus, e reverenciado por uma legião de crentes. Consta que previu coisas como as batalhas aéreas e o rádio.


Nostradamus


Pode até ser. Seus versos são uma linguagem tão mística e indireta, que qualquer um deles pode ser interpretado para significar o que quer que a gente queira que signifique. Certa vez, fazendo todas as concessões possíveis e imagináveis a favor do antigo vidente, estudei uma centena dos seus prognósticos e cheguei à seguinte suma estatística: 3 corretas e 18 erradas, e as demais 79 eram umas bobagens tão obscuras que não dava sequer para saber o que o velho francês queria dizer com elas.

Não chega a ser um resultado de impressionar. Contudo, Nostradamus conseguiu ficar famoso no mundo das profecias - uma fama que qualquer oráculo moderno adoraria alcançar.  Nostradamus não acertava com freqüência, mas não há dúvida de que previa com freqüência.

Mais modernamente, tomemos a atual futuróloga e autoproclamada médium Jeane Dixon. É famosa por alguns palpites que se confirmaram, principalmente um: previu o assassinato do presidente Kennedy. Um espanto, não é verdade? É, mas a lista das suas previsões erradas nunca mereceu a mesma divulgação. Segundo Ruth Montgomery, sua biógrafa e discípula, a Sra. Dixon previu que a URSS e a China se uniriam sob um só líder, que o dirigente sindical Walter Reuther seria candidato a presidente dos Estados Unidos, que pesquisas iniciadas no começo deste século resultariam na cura do câncer, que...

Pois é, você já entendeu. O Committee for Scientific Investigation of Claims of the Paranormal (Comitê para Investigação Científica de Afirmações dos Paranormais), grupo de estudiosos sediado na Universidade Estadual de Nova York, em Buffalo, examinou a folha corrida de Jeane Dixon, e concluiu que não era pior nem melhor que qualquer palpiteiro normal.

Como uma suposta capacidade de enxergar o futuro tem um certo apelo hipnótico, é fácil deixar-se fascinar por um profeta de sucesso. No mundo do dinheiro, então, isto é mais verdadeiro ainda. Alguns anos de palpites freqüentemente certos são suficientes para um profeta conseguir uma legião de seguidores - em certos casos, uma legião tão grande, que as profecias, por isto mesmo, acabam se confirmando.

Foi o que aconteceu com Joseph Granville, o oráculo do mercado de capitais. No começo da década de 80, era tanta gente baseando suas decisões nas previsões de Granville, que, quando ele dizia que uma coisa aconteceria, ela acabava acontecendo porque as pessoas acreditavam que aconteceria. Ou seja, quando ele dizia que o mercado cairia, isto assustava os compradores, que desapareciam fazendo com que o mercado despencasse.  Assim foi no começo de 1981, quando Granville mandou seus discípulos venderem tudo. No dia seguinte a essa famosa advertência, a Bolsa despencou 23 pontos no índice Dow, Wall Street inteira só fazia ihs e ohs! Mas que poderoso profeta era o nosso Granville! A queda foi breve, porém impressionante enquanto durou.


Joseph Granville


Se você fosse um estudioso dos Axiomas de Zurique, poderia ter-lhe parecido tratar-se de uma exceção à lição do 4º Grande Axioma. Embora a maior parte das profecias não valha um níquel, não seria uma boa pôr o seu dinheiro num profeta como Granville? Se as previsões dele acabam se confirmando por si mesmas, fazer o que ele diz não equivale, praticamente, a ganhar na certa?

Não. Nem mesmo as profecias que se autoconfirmam o fazem de forma confiável. No mesmo ano de 1981, mais adiante, Granville tornou a testar os seus poderes proféticos. Sua bola de cristal lhe disse que na segunda-feira, 28 de setembro, o mercado despencaria de novo. O anúncio foi feito ao mundo. Baseados nisto, alguns especuladores compraram, outros venderam a descoberto. Como Granville, estavam convencidos de que o mercado cairia.

O que aconteceu foi que a Bolsa de Nova York, naquele dia, registrou uma das maiores altas da sua história; no dia seguinte, Tóquio e os mercados europeus acompanharam.  Alguns seguidores de Granville ficaram muito surpresos, mas não era para terem ficado: acabavam, apenas, de assistir à comprovação de que Granville é que nem todo mundo - às vezes acerta, outras vezes erra.

Todo profeta às vezes acerta, outras vezes erra - erram mais do que acertam, mas quem é que vai adivinhar?  Para isto, seria necessário fazerem-se previsões acerca das previsões dos profetas. E se fôssemos capazes dessas previsões, para que precisaríamos de profetas? Como não somos, não podemos apostar em nada do que eles dizem. Assim sendo, vamos deixar de lado essa coisa de ficar tentando dar uma espiadinha no futuro. Não dá.

Vejamos outro exemplo. Em 1970, um editor de economia, colunista e oráculo financeiro chamado Donald I.  Rogers publicou um livro sob o título How to Beat Inflation by Using It (‘’Como Usar a Inflação para Derrotála’’).  O livro tornou-se conhecido pelo conselho (magnificamente errado) de que não se devia comprar ouro.





Ainda assim, podemos perdoar Rogers pelo seu erro de previsão. Ouro era o ponto cego de todas as bolas de cristal da época. Mais interessante é a relação de ações que o profeta achava que teriam um bom desempenho nos anos subseqüentes.

Rogers raciocinava que terras constituiriam boa proteção contra a inflação. Assim, imaginava ele, era boa idéia comprar ações de empresas que possuíssem muita terra. Com base nisto, recomendou ações a serem compradas.

Desde então, algumas de suas recomendações renderam bastante bem. Warner Communications, por exemplo. Se você tivesse comprado o papel em 1970, poderia tê-lo vendido com belos lucros em vários momentos, até a empresa começar a ter problemas, em meados de 1983. Outras ações listadas por Rogers, como a ITT, por exemplo, foram catastróficas.

O problema é o seguinte: se você tivesse lido o manual de sobrevivência de Rogers em 1970, e aceitado alguns dos seus prognósticos, como se teria saído?  Pois é, dependeria da sua sorte. Da lista dele, se você tivesse escolhido ganhadores, teria ganhado; escolhesse perdedores, teria perdido. A sorte manteve o tempo todo o controle dos resultados. Sendo assim, uma boa pergunta seria: então, para que ficar escutando profetas?

Passados o tempo e os fatos, pode parecer injusto ficar crucificando Rogers e outros oráculos. Nada mais fácil do que ficar aqui sentado, hoje, e dizer quais foram e quais não foram as boas especulações dos anos 70. 

Seria compreensível se um desses profetas me desafiasse:

- Olhe aqui, seu Gunther, quem é que lhe dá o direito de ficar aí catalogando os nossos palpites errados?  Seria capaz de se sair melhor? É tão bom profeta assim?  Eis aí uma boa pergunta. Não, não sou profeta, e é exatamente isto que estou dizendo. Jamais fiz qualquer tentativa séria de ler o futuro (embora, é claro, esteja sempre pensando nele), nunca disse que era capaz de ler o futuro - na verdade, acabo de gastar várias páginas para dizer que não há como fazê-lo. As pessoas que estamos criticando aqui, porém, afirmam poder enxergar à frente. Estabeleceram-se como oráculos, são pagos pelos seus prognósticos, e sabem, ou deveriam saber, que há pessoas que tomam importantes decisões baseadas no que afirmam. Parece-me perfeitamente justificável, então, responsabilizar esses profetas pelas suas profecias. Se o que eles vendem é um boletim de profecias, temos todo o direito de submeter esse serviço a análise crítica, e tentar descobrir quanto vale.

A conclusão é que não vale grande coisa. Ficar dando atenção a profetas não dá lucro nenhum.  Há coisas que podem ser preditas. Sabemos precisamente, por exemplo, a que horas o sol se levantará a cada manhã. O calendário que o banco me dá de brinde, todo mês de janeiro, diz quais serão as fases da lua nos 12 meses seguintes. Previsões do tempo são menos confiáveis, mas ainda assim são razoavelmente dignas de crédito, e têm melhorado.

Por que tais coisas podem ser previstas, e por que são confiáveis essas previsões? Porque se trata de eventos físicos. Os Axiomas de Zurique, porém, tratam do mundo do dinheiro, que é um mundo de eventos humanos.  Não há método, não existe ninguém capaz de prever eventos humanos.

Uma das armadilhas em que os profetas do mundo do dinheiro costumam cair é a de esquecerem de que estão tratando do comportamento humano. Falam como se coisas como a taxa de inflação ou os altos e baixos do índice Dow fossem eventos físicos. Ao encarar assim esses fenômenos, é compreensível que o oráculo se deixe levar pela ilusão de que eles são passíveis de previsão. Na realidade, porém, é claro que os fenômenos envolvendo dinheiro são manifestações do comportamento humano.

A Bolsa de Valores, por exemplo, é um gigantesco mecanismo de emoções humanas. O que homens e mulheres estão fazendo, pensando, sentindo é que determina as altas e baixas das ações. O preço das ações de determinada empresa não sobe por causa de dados abstratos num balancete, nem porque as perspectivas futuras da empresa são objetivamente boas. O mercado não desaba porque um computador, num canto qualquer, de algum modo, resolveu que está subindo a pressão vendedora, mas porque pessoas estão preocupadas, desanimadas ou temerosas. Ou simplesmente porque vem vindo um fim de semana prolongado, quatro dias feriados, e os compradores foram todos para a praia.




O mesmo ocorre com todos os grandiosos índices e números com que os economistas gostam de brincar: PNB, o nível da construção civil, as taxas de inflação. Tudo resulta de interação humana, homens e mulheres incansavelmente empenhados na eterna batalha pela sobrevivência, pelo auto-aperfeiçoamento. A mesma coisa acontece com os resultados finais desses índices fermentando juntos: recessões, recuperações e explosões de crescimento, bons e maus tempos. Tudo causado por gente, por pessoas.

E, assim sendo, tudo totalmente imprevisível.  O fato simplesmente, é que são demais as variáveis envolvidas, para que se possa obter uma previsão confiável de algo como a taxa de inflação. Essa taxa resulta de milhões de pessoas tomando bilhões de decisões:  operários decidindo quanto querem ganhar, patrões decidindo quanto querem pagar, consumidores estabelecendo os preços que estão a fim de engolir, e todo mundo tomando decisões sobre sentimentos difusos de épocas duras ou de prosperidade, temor ou segurança, tristeza ou animação. Alguém afirmar que é capaz de produzir previsões confiáveis a respeito de uma complexidade espantosa como esta parece arrogante - mais: parece ridículo.

Como diz o 4º Grande Axioma, o comportamento humano é imprevisível. Como no mundo do dinheiro todas as previsões se referem a comportamento humano, o melhor é não levar nenhuma a sério.

Levá-las a sério pode conduzir você por tristes e soturnos caminhos. O mercado de ações, provavelmente, é o que oferece alguns dos exemplos mais cruéis. Tomando um deles ao acaso, vejamos a previsão para 1983, da Value Line Investment Survey, publicação da empresa Value Line, sobre computadores Apple.  A Value Line vende um serviço oracular periódico no qual avalia o que chama de ‘’desempenho’’ das ações nos 12 meses futuros. Por outras palavras, espia o futuro de cada ação, e diz o que acha que vai acontecer com o preço delas ao longo do ano.

É preciso que se diga: nos últimos meses, a Value Line tem-se saído muitíssimo bem nas suas previsões. Contudo, estamos aqui diante da mesma situação que discutimos em relação a Donald I. Rogers e sua lista de compras para 1970. Se você fosse assinante da Value Line Survey e lhe levasse as previsões ao pé da letra, o seu destino financeiro muito dependeria da sua sorte de aproveitar as boas profecias e descartar as más.

E como houve más profecias! Uma das piores dizia respeito à Apple. No dia 1º de julho de 1983, a Value Line publicou uma lista de ‘’Ações Escolhidas por Desempenho’’. Fazia parte dessa relação elitista a Apple, então negociada a cerca de 55 dólares.  Alguns meses depois estava a 17,25.

As causas da débâcle, é claro, foram fatores que a Value Line não tinha como prever em julho. Ao explicar uma previsão que deu errado, o oráculo sempre pode alegar ‘’fatores imprevisíveis’’. Mas é exatamente este o problema. Toda previsão corre o risco de levar com fatores imprevisíveis pela proa. Nenhuma previsão que implique comportamento humano pode ser 100% composta de fatores previsíveis. Toda previsão implica risco.  Nenhuma, jamais, é confiável.

Muitos dos que compraram Apple em 1983 devem ter vendido antes que o papel atingisse o seu ponto mais baixo. Alguns, agindo conforme o 3º Grande Axioma, terão abandonado o barco apenas com pequenos prejuízos.

Há situações, porém, em que é impossível pular fora a tempo. Uma previsão errada pode, se você não for precavido, amarrá-lo durante anos a uma situação de prejuízo.

Vamos ver o caso daqueles pobres coitados que, entre o início e meados da década de 70, compraram CDBs de longo prazo. Conforme já observamos, economistas haviam previsto que as taxas de juros subiriam no começo dessa década, e em seguida se nivelariam ou até cairiam um pouco. A primeira parte da previsão se confirmou. As taxas subiram. Bancos começaram a oferecer CDBs de quatro e de seis anos, com taxas de juros nunca vistas: 7%, 8% ao ano.

Para obter esses imensos ganhos - do ponto de vista do começo dos anos 70, eram imensos -, você era obrigado, lógico, a dar adeus ao seu dinheiro por um determinado número de anos. Não havia como sair, exceto por acordos especiais que implicavam dolorosas penalidades. Como é que os banqueiros conseguiram convencer o pessoal a deixar o dinheiro trancafiado com eles esse tempo todo? Conseguiram-no divulgando e repisando a tal previsão dos economistas.

- Olhem aqui, são 7% que vocês vão levar! - dizia o gerente do banco ao casal candidato a depositante, que apertava nas mãos trêmulas as economias de uma vida inteira. - Onde já ouviram falar de uma taxa dessas? São capazes de imaginar um ganho maior? Nunca! O negócio é vocês pegarem enquanto é possível. Os maiores economistas estão dizendo que os juros vão baixar no ano que vem, ou no próximo, e o nosso pessoal aqui também acha. Vocês fecham nesses 7%, e ficam só olhando e rindo das coisas acontecendo! 

O discurso era fantástico. Até as previsões darem errado.  As taxas continuaram subindo, chegando a níveis inimagináveis. No final da década, havia bancos oferecendo CDBs de seis meses a taxas de 10%, 11%, algo de arrepiar os cabelos.  

Esses papéis de seis meses tornaram-se muito populares, com muita gente querendo-os. Inclusive a turma que estava com o seu capital cumprindo penas de seis anos, a 7% ao ano.

Estratégia Especulativa:  

O 4º Grande Axioma diz para você não montar o seu programa especulativo baseado em previsões, porque dá errado. Esqueça todos os prognósticos. No mundo do dinheiro, um mundo moldado pelo comportamento humano, ninguém tem a mais remota idéia do que acontecerá no futuro. Preste bem atenção: ninguém.




Claro, todos nós pensamos no que será que vai acontecer, e nos preocupamos. Mas tentar escapar a essas preocupações apoiando-se em previsões é pobreza na certa. O especulador de sucesso não baseia suas jogadas no que, supostamente, vai acontecer; ele reage ao que realmente acontece.

Trace o seu projeto especulativo baseado em reações rápidas a eventos que você vê acontecendo à sua frente, na hora. Naturalmente, ao escolher um investimento e colocar o seu dinheiro nele, você tem esperança de que o seu futuro será brilhante. Essa esperança, presumivelmente, vem de muito estudar e de muito pensar. O ato de pôr o seu dinheiro na operação é, por si só, uma espécie de previsão. Você está pensando: ‘’Tenho razões para esperar que isto dê certo.’’ Não deixe, contudo, que tal pensamento se congele num pronunciamento oracular:  ‘’Vai dar certo, porque as taxas de juros cairão’’. Nunca, jamais, perca de vista a possibilidade de ter apostado no cavalo errado.

Se a especulação der certo, e você se vir a caminho da linha de chegada preestabelecida, tudo bem. Mas se, apesar de todas as promessas de todos os profetas, as coisas começarem a sair erradas, lembre-se do 3º Grande Axioma: abandone o barco.




















Um comentário:

  1. Basta lembrar do polvo Paul na Copa de 2010, coube ao molusco "prever" com exatidão todos os jogos da seleção Alemã e ainda o vencedor da final Espanha x Holanda, calando a boca de especialistas e profetas esportivos do mundo todo.

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