quarta-feira, 11 de junho de 2014

DO OTIMISMO E DO PESSIMISMO - EXTRAÍDO DO LIVRO "OS AXIOMAS DE ZURIQUE"












Otimismo significa esperar o melhor, mas confiança significa saber como se lidará com o pior. Jamais faça uma jogada por otimismo apenas.

O otimismo sempre teve críticas favoráveis. É considerado um traço positivo da personalidade. Otimistas são pessoas alegres, animadas, bons companheiros para horas difíceis. Nos EUA, durante a Grande Depressão, na década de 30, chegou-se a criar uma rede nacional de Clubes de Otimistas. Sua atraente doutrina dizia que as coisas melhorariam, bastando que as pessoas acreditassem que estavam melhorando. Passado algum tempo, realmente a Depressão acabou, e alguns otimistas disseram: - Estão vendo? Funcionou.

Talvez o otimismo tenha mesmo desempenhado um papel - com uma mãozinha da Segunda Guerra Mundial. Mas é melhor você ter muito cuidado com o papel que o otimismo desempenha na sua vida financeira.




Uma genética sensação de esperança e expectativas positivas não podem fazer nenhum mal. ‘’Vou aprender. Vou me dar bem. Vou conseguir.’’ Realmente, sem um fundamento de esperança, como é que você vai virar especulador? Porém, no que se refere especificamente a transações de dinheiro, preste a maior atenção ao otimismo. Pode ser uma atitude mental extremamente perigosa.

Jogadores profissionais têm perfeita noção disto. É um dos seus mais eficazes instrumentos para limpar o bolso de amadores.




No pôquer, quando um profissional se defronta com uma situação na qual, pelas probabilidades, não deve apostar, ele não aposta. Passa. Abandona o que já pôs na mesa, mas evita perdas maiores.

Em situação idêntica, o amador se atrapalha todo no otimismo. ‘’Posso dar uma sorte’’, pensa ele. ‘’Talvez saia a carta de que eu precise... Talvez esse cara esteja blefando...’’ De vez em quando, é verdade, o amador dá sorte. Acontece o que as probabilidades diziam que não aconteceria. O amador derrota as probabilidades um número suficiente de vezes para manter vivo o seu louco otimismo. É assim que ele continua apostando em paradas perdidas. Vez por outra, é possível derrotar as probabilidades, mas não sempre. Geralmente, se as probabilidades disserem que você está frio, está mesmo.

Sabedor disto, e sabendo como é fácil convencer o amador a apostar quando não deve, o profissional fica rico. O profissional não tem otimismo. O que ele tem chama-se confiança. Confiança nasce do uso construtivo do pessimismo.

Descendo pelo vale das sombras, o otimismo sorri e diz: as coisas nunca são tão ruins quanto parecem. Em vez disto, isto às vezes é cantado. Existem, sobre o tema, quase tantas canções quantas sobre o amor não correspondido. É mesmo um bom tema, meloso, mas jamais permita que se misture à sua filosofia financeira. No pôquer, e numa porção de outros mundos especulativos, quase sempre as coisas são tão ruins como parecem.




Muitas vezes são até bem piores. São piores pelo menos tantas vezes quantas são melhores. Se quiser, aposte em que são melhores; porém, na ausência de provas concretas em contrário, estará sendo super otimista. Na maioria das vezes, o curso mais seguro é presumir que, se uma situação parece ruim, é ruim.

‘’Jamais faça uma jogada por otimismo apenas’’, diz este 9º Grande Axioma. Em vez disto, saia atrás de confiança. Confiança não vem de se esperar o melhor; vem de saber como se lidará com o pior.

O profissional de pôquer sabe o que fazer se as cartas se voltarem contra ele. Naturalmente, espera que isto não ocorra, mas não larga o seu destino por conta dessa esperança. Entra no jogo preparado e equipado para, se estiver em maré de pouca sorte, manter a cabeça fria. Pessimismo construtivo é isso.




Em contraste, vamos dar uma olhada na triste saga do jovem casal que achava que o otimismo era suficiente. Vamos chamá-los Sam e Judy, que não são os seus nomes verdadeiros. A história me foi contada por uma corretora de imóveis num subúrbio de São Francisco.

Sam e Judy eram representantes bastante típicos dessa fauna chamada yuppies (young urban professionais - ‘’jovens profissionais urbanos’’). Sam trabalhava em propaganda, Judy era residente de pediatria num hospital.

Alimentavam grandes sonhos. Sam queria ter a sua agência, um dia, e Judy queria uma clínica particular. Sadiamente compristas, falavam abertamente em ficarem ricos. A fim de apressar o processo, ainda no princípio do casamento haviam começado a expor suas economias a riscos.




No início, considerando-se a inexperiência dos dois como especuladores, até que não foram mal. A sorte estava ao lado deles. Ao longo de alguns anos, tinham conseguido dobrar o capital que, no dia do casamento, consistia de duas cadernetas de poupança que chegavam a cerca de 12.000 dólares. Estavam com 25.000, mais ou menos. Foi então que a sorte virou.

Souberam de um imenso loteamento num estado do Sudoeste. Para a construção de casas ou como investimento, eram oferecidos lotes de vários tamanhos, de 2.000 metros quadrados para cima. Mas a imobiliária não ia lá muito bem. Num trecho do enorme empreendimento, haviam aberto estradas e puxado luz, conforme prometido, mas o dinheiro acabara ali. A maior parte da área continuava um semi-deserto intocado.

A fim de levantar o dinheiro desesperadamente necessário, passaram a baixar os preços dos lotes nas áreas nuas. Comparados aos terrenos urbanizados, esses lotes pareciam ridiculamente baratos.




Animadíssimos, Sam e Judy estudaram a interessante situação. Com o dinheiro de que dispunham, dava para comprar um belo pedaço da área não urbanizada. Revendendo os lotes na hora certa, seriam capazes de duplicar, até de triplicar o investimento em pouco tempo. Bem, isto se as prometidas estradas viessem a ser abertas, e se a luz algum dia chegasse mesmo até lá.

Tratava-se de uma aposta no destino da companhia urbanizadora. Se recuperasse a sua saúde financeira, e se as várias questões na justiça fossem decididas a seu favor, e se mais uma porção de coisas, com o tempo, então, estradas e luz elétrica alcançariam os lotes em que Sam e Judy estavam interessados Se saísse tudo ao contrário, porém, aquilo permaneceria deserto inacessível para sempre.

Os folhetos e os corretores, naturalmente, faziam promessas, ou, para sermos mais exatos, balbuciavam frases encorajadoras que soavam como promessas, mas que, legalmente, não obrigavam a imobiliária a coisa alguma: ‘’Prevê-se que...’’, ‘’Os diretores acreditam que...’’ Sam e Judy não eram tão ingênuos para entrarem nessa. Sabiam dos riscos. A companhia poderia falir. Ou os acionistas, simplesmente, podiam decidir que não queriam mais e liquidar o negócio, pôr no bolso o que sobrasse de dinheiro em caixa e ir em frente. Nesses casos, as terras de Sam e Judy passariam a valer menos do que a pechincha que estavam pagando. Na realidade, poderiam acabar pura e simplesmente invendáveis. O dinheirinho deles era capaz de ficar preso ali eternamente.

Mas eles achavam que valia a pena correr os riscos. Eram otimistas. Assumir riscos não tem nada de errado, é lógico. Afinal, especulação é exatamente pôr o seu dinheiro num projeto cujo resultado não é previsível. Conforme vimos ao estudar outros Axiomas, praticamente todos os projetos são de resultados imprevisíveis. Os assuntos humanos não mostram padrões confiáveis. Não há previsão em que se possa acreditar. Esteja você comprando ações da IBM ou terra nua, tudo é jogo. Ao arriscarem o seu dinheiro na esperança de ganho, Sam e Judy não estavam fazendo nada que os chamados ‘’investidores’’, pessoas supostamente prudentes, não façam o dia inteiro em Wall Street.




Sam e Judy, porém, cometeram um erro fundamental: não foram pessimistas o bastante; não pensaram em como se safariam caso as cartas se voltassem contra eles.

Comprar ações da IBM é um jogo, mas se a coisa não andar, você tem saída: vende. O 3º Grande Axioma nos ensina que isto não é a coisa mais fácil do mundo de se fazer, mas pelo menos é uma possibilidade que fica aberta. Sempre haverá quem compre, porquê há sempre alguém fazendo mercado para IBM. Ao entrar no negócio, você pode determinar a saída: se o preço descer a tanto, cair fora.




Saber como lidar com o pior - isto é confiança.

Tivessem sido menos otimistas, Sam e Judy poderiam ter estabelecido uma saída. A terra em que estavam de olho ficava a quase dois quilômetros da área desenvolvida, de onde terminavam as estradas de acesso. A distância era parte da razão de o preço ser tão baixo. Outras áreas nuas, mais próximas, estavam igualmente à venda, a preços relativamente mais altos. Sam e Judy poderiam ter comprado nessas áreas mais caras. Assim, caso a imobiliária falisse, com uma estradinha de acesso relativamente curta daria para tornar suas terras utilizáveis e vendáveis.

Fazendo isto, ainda sairiam do negócio com prejuízo. Mas, ao menos, poderiam sair.

Em vez de pensarem mesta triste alternativa, apostaram apenas no seu otimismo. Para eles, parecia um quadro cheio de perspectivas. Se a imobiliária se recuperasse das suas dificuldades e levasse a termo os planos anunciados - e Sam e Judy descobriam razões para acreditar que isto aconteceria - eles e outros investidores nas mesmas áreas teriam ganhos de arrepiar os cabelos. Foi assim que Sam e Judy entraram num negócio sem saída.

Isto tudo aconteceu há muitos anos. A imobiliária já deixou de existir faz tempo. Estradas e luz elétrica, adeus. As autoridades judiciárias do estado até hoje estão à procura dos donos, a fim de obrigá-los a um acerto de contas. Até hoje, nada. Enquanto isso, Sam e Judy estão entalados com uma área de terra nua que só pode ser visitada a pé ou em lombo de burro, e não parece que vai mudar tão cedo.

É possível que jamais consigam vender. Eles e os demais proprietários das áreas têm conversado sobre ratear os custos da abertura de estradas de acesso e de puxar luz até lá, mas as coisas não têm andado. São despesas muito altas, e ainda que alguns se disponham a pagar suas partes, outros não querem. Traídos pelo otimismo, Sam e Judy foram apanhados numa armadilha que, pode-se dizer, é pelo resto da vida.




A sensação produzida pelo otimismo é boa, daí ser ele tão traiçoeiro. É uma sensação muito melhor que a do pessimismo. É uma atração hipnótica. Como as sereias da antiga lenda grega, que com seus cantos atraíam os marinheiros para a morte nos rochedos.

Ao se iniciar, qualquer negócio tem um número ilimitado de possibilidades futuras, algumas boas, outras más, todas igualmente possíveis. Tanto é possível que você suba como desça. Mas, quais as possibilidades que você acha mais prováveis? As boas, claro.




O otimismo é do homem, e provavelmente incurável. Mantendo um olho para espiar um futuro impenetrável, esperamos o melhor, nos convencemos a esperar o melhor. Talvez seja impossível a vida sem otimismo. As especulações seriam impossíveis, com toda certeza. O próprio ato de arriscar é uma afirmação de otimismo em relação ao resultado desconhecido. Aí está o paradoxo: o otimismo, que dá uma sensação boa e pode ser até necessário, escapando ao controle é capaz de nos levar à catástrofe financeira.

Não apenas leva à catástrofes do gênero da que se abateu sobre Sam e Judy como é uma das principais causas de erros de cálculo e de opinião. Wall Street exibe provas disto diariamente. Esteja como estivar o mercado num determinado dia, sempre se encontram otimistas para dizer que a próxima grande alta começa semana que vem.

Há também os pessimistas para dizer o contrário. Quem é escutado? O mais das vezes, os otimistas; o seu canto é mais melodioso.

Você mesmo pode verificar isto. Grandes jornais financeiros como o Wall Street Journal e o New York Times publicam diariamente colunas sobre mercado, mexericos e opiniões sobre a Bolsa. Assim que se encerra o pregão, os colunistas pegam o telefone e ligam para corretores, analistas de investimentos, e outros experts capazes de falarem com nexo sobre os negócios do dia. Cada jornalista tem os seus favoritos para estas conversas. Quais os critérios dos jornalistas para a escolha dos seus personagens? O que qualifica uma pessoa para ocupar a posição de oráculo posterior, ou anterior? Três coisas, basicamente: acessibilidade, falar (e pensar) articuladamente, e otimismo.

Pelas minhas próprias pesquisas, ao longo de vários anos, pelo menos três quartos do que apareceu nessas colunas sobre o mercado foram opiniões otimistas. Isto, com toda certeza, é uma visão distorcida: do ponto de vista do dia-a-dia da Bolsa, o futuro do mercado tanto pode ser ruim como bom. Altistas e baixistas deveriam aparecer em número quase idênticos. A acreditarmos nos colunistas, a grande maioria do mercado é altista. Por quê? As explicações são duas:

Primeira: os altistas são realmente mais numerosos que os baixistas. Isto, naturalmente, porque o otimismo é mais gostoso que o pessimismo. Então, mesmo que um jornalista muito consciencioso saísse à cata de um número igual de informantes baixistas e altistas, visando a publicar uma coluna bem equilibrada, acabaria frustrado: é muito mais fácil achar altistas.




Segunda: jornalistas econômicos não costumam procurar muito esse equilíbrio. Por que não? Porque preferem conversar com altistas. O canto é mais melodioso. Assim, ainda que houvesse igual número das duas espécies perambulando por Wall Street, os altistas continuariam mais representados como fontes.

Dentre os altistas, os mais altistas são os que mais falam com os jornalistas. Conheço uma camarada cujo nome aparece em jornais, rádio ou televisão pelo menos duas vezes por mês. Trabalha numa das maiores e mais antigas corretoras de Wall Street. É uma pessoa tão doce, a sua conversa é tão boa que eu não gostaria de constrangê-la nem de prejudicar-lhe a imagem citando aqui o seu nome. Seria um pecado, acho eu, conspurcar o som da sua música.




Os colunistas não o largam de mão porque é um otimista empedernido. O fato de estar geralmente errado não parece abalar ninguém, nem diminuir a sua atração. Ao longo de 1980 e 81, ele jamais se cansou de prever que uma grande alta vinha chegando. Não veio, mas os colunistas não pararam de citá-lo. Finalmente, em agosto de 1982 ele teve razão. Chegou a grande alta, que na primavera de 83 desandou. Não tem problema, dizia a valente alma, estamos assistindo apenas a uma pausa temporária na alta. Continuava afirmando que o índice Dow Jones logo bateria 1.300. Não bateu. No primeiro quadrimestre de 1984, andou se arrastando pelos 1.100. O que só fazia a fonte ficar mais otimista ainda. Bastava um bom pregão para ele dizer que o paraíso ficava logo ali na esquina. No começo de abril, depois de semanas e semanas de tristezas, o índice conseguiu subir 20 pontos num pregão. No New York Times, o nosso otimista afirmava que era o começo da segunda fase de grande alta.

No dia seguinte, o índice devolveu metade da alta da véspera. Mais um pregão, e devolveu o resto. A prometida ‘’segunda fase’’ parecia um pouquinho adiada. O que não parecia afetar a fonte, nem diminuir o número de colunistas que o procuravam. Na semana seguinte, lá estava ele sussurrando o seu canto de sereia ao ouvido do Wall Street Journal.




É por aí que funciona a exasperante inteligência humana. Otimismo e otimistas nos fascinam. Não sabem absolutamente nada mais sobre o futuro que os pessimistas; nem podemos presumir que, ao escolher entre os dois, vale mais a pena, objetivamente, dar ouvidos ao otimista. Contudo, conforme acabará aprendendo, se já não aprendeu, você sempre preferirá escutar os otimistas.

À sua volta, há otimistas por todo lado, e um deles, dos mais insistentes, com certeza está dentro da sua cabeça. Cuidado com eles. São capazes de confundir suas opiniões da forma mais alarmante.




Na antiga lenda, para passar com o barco pelas sereias, Odisseu tapou com cera os ouvidos da sua tripulação e se amarrou ao mastro. 




Essas defesas não são eficazes contra o canto dos otimistas. Você jamais conseguirá bloquear totalmente a canção; afinal de contas, você também é gente, é humano. O que pode, sim, é manter-se atento à inclinação otimista da sua bússola interna, e ficar alerta aos seus perigos.

Quando se sentir otimista, tente examinar se essa sensação gostosa encontra, realmente, justificativa nos fatos. Na metade das vezes pelo menos, não tem nenhuma.

Estratégia Especulativa

O 9º Grande Axioma adverte que o otimismo pode ser inimigo do especulador. Dá uma sensação boa e, por isso mesmo, é perigoso. Costuma toldar completamente o raciocínio. Pode levá-lo a caminhos sem saída. E, ainda que haja saída, o otimismo é capaz de persuadi-lo a não a utilizar.


O Axioma diz que não se deve entrar em nenhuma jogada apenas com otimismo. Antes de pôr o seu dinheiro num negócio, pergunte-se como se safará se der errado. Tendo isto muito bem resolvido, já tem em mão algo mais que o mero otimismo. Tem confiança.















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